domingo, 8 de maio de 2011

Aventuras do Menino Danta e seu amigo Guerra - Romance.

Autor: WILLIAM LOPES GUERRA



NOTA: A partir desta imagem, toda semana, haverá um Capítulo da história que passamos a contar. Hoje, como "postar" é um verbo transitivo direto e circunstancial, preferimos dizer "publicamos" (infinitivo pessoal) do verbo transitivo direto e, nesse caso, fazer-se conhecer essa história, o verbo é pronominal.

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PALAVRAS INICIAIS
                                                                              
                                                                              
                  NA METADE do século XX, mais ou menos, passou-se essa história extraordinária de dois amigos inseparáveis.
              Dois meninos espertos, vivos, brincalhões e aventureiros. Todos os dias, que chovesse ou fizesse sol, lá iam eles, embornal de pano entrançado nas costas, baladeira nas mãos e, na funda da arma de brinquedo de matar passarinhos, uma pedra feita com lama preta apanhada à beira da lagoa: a lama era burilada com as mãos, formando uma bolinha miúda, e depois colocada ao sol para secar. Em seguida fazia-se outra bolinha, mais uma, dezenas de bolinhas que se transformavam em balas mortíferas.
              Banhos na lagoa, canga-pé, soltos e irresponsáveis, donos dos próprios narizes, os dois, a fazerem estripulias nesse mundão que era a pequena cidade chamada de Verdejante.
              Verdejante possuía um cenário favorável para os folguedos e diabruras inventadas pelos dois amigos: uma serra repleta de árvores seculares, rochedos e grutas milenares e animais de muitas espécies; um vale muito verde onde se plantava de tudo, desde hortaliças às frutas regionais: manga, laranja, goiaba, limão, melancia, mamão, pinha e, ainda, os terrenos alagados adequados ao cultivo do arroz.
              Do outro lado da cidade, zona oeste eram os tabuleiros, terrenos com muita areia próprios para o feijão, o milho, o algodão e o caju, revestida por grande área de mata rala característica pelas capoeiras de marmeleiro, junco, mofumbo, além daquelas resistentes às intempéries como o juazeiro, a oiticica e a carnaúba.
              Mas o que encantava mesmo aos dois aventureiros, e à meninada do lugar, era a lagoa. Peixes e margeada por vazantes que alimentavam muitas famílias. Ali cultivavam a batata, a macaxeira, o jerimum, o tomate, e, com destaque, o arroz, donde surgiu a profissão dos “espantadores de passarinhos”, isto é, passava-se o dia vigiando o arrozal espantando as aves que vinham em busca de comida naquela verdura exuberante, aí os espantava puxando um cordão atado a uma lata com pedras que fazia um barulho capaz de amedrontar aves famintas que fugiam para longe.
              À lagoa Danta e Guerra frequentavam diariamente. Às vezes, com idas pela manhã e pela tarde, para banhos memoráveis e nados acrobáticos. Para eles, e para todos que a desfrutavam, era uma delícia.
              A lagoa, ainda existe, pois possui três léguas de extensão, não seca nunca, mas os banhos estão proibidos, não somente por causa do banho em si, mas porque era em certos pontos de suas margens que as lavadeiras limpavam a roupa suja dos habitantes de Verdejante.
              Uma pena. Os meninos d’agora só têm o direito de contemplar sua beleza, ou passear em botes e canoas. Nada de mergulhar em suas águas calmas e habitadas por peixes. Estes são fisgados por pescadores organizados e que obedecem à lei. Têm a sua associação e retiram da dadivosa lagoa o sustento dos seus familiares.
              Na invernada os rios Umari (afluente do rio Apodi) e o Apodi, este rio que nasce na serra de São Miguel e deságua no mar de Areia Branca, quando enchiam seus leitos respectivos, e ficavam de barreira a abarreira, para lá seguiam os garotos, vê quem atravessava em menos tempo suas águas correntes e caudalosas. Era uma festa, uma aventura nas águas dos rios que cortavam o município, e que traziam alento para os moradores do lugar, sinal que não faltaria água para os animais e, passado o inverno, as cacimbas e as barragens ficariam cheias, prontas para suportarem o verão inteiro.
              Os dois meninos gostavam de diversão, descobrir novos recantos onde pudessem estar descontraídos, camisas abertas ao peito sem importarem com a escola, as obrigações da infância. A infância deles, como dos demais garotos que moravam em Verdejante, era o brinquedo, a passarinhada, o furto de frutas nos quintais alheios, e as mais de mil invencionices pelos arredores da cidade naqueles tempos ditosos.
              Época que mais apreciavam era a das fogueiras: Santo Antônio, São João e São Pedro no mês de junho. Aí tinha o que ver. Balões subindo para o céu, fogos de lágrimas e foguetões explodindo no ar. Milho assado nas fogueiras em frente às residências. Barracas em redor da igreja matriz vendendo bolos, refrescos de abacaxi, cocadas e bonecos de açúcar, um sonho para a garotada inocente.
              Danta e Guerra não perdiam uma noite de foguetão: disputavam à tapa, com outros peraltas, as tabocas que despencavam lá de cima, depois do estouro ensurdecedor, que anunciava o regozijo, a comemoração pela passagem daquele mês abençoado.
              Curiosos, chegavam bem perto do feitor dos balões acendendo a bucha embebida com querosene, óleo diesel e sebo que fazia inflar o colorido balão e, uma vez cheio de gás, subia, subia e sumia do outro lado da lagoa. Mas o gostoso para eles, os meninos, era o balão que apresentasse um defeito, subir pouco e pegar fogo caindo no meio da praça. A gritaria era geral e eles corriam a acompanhar o fracasso daquele misterioso objeto que voava, como na estória de João e Maria que sumiram numa noite escura dentro de um. Outro instante de admiração e gozo dos pequenos, ouvir, em noites de lua, nas debulhas de feijão, a contadora de fábulas infantis os encantarem com João e Maria, O Pavão Misterioso, O Menino Que Não Tinha Medo de Nada, A Mula Sem Cabeça e tantas outras que aguçava a curiosidade da meninada.
              Foi nesse cenário, nessas condições do interior do país que nasceram e cresceram os dois amigos: Guerra e Danta, a aprontarem os mais mirabolantes episódios que, apesar de inocentes, deram muito trabalho aos seus pais e vizinhos, a ponto de terem o direito do registro de tais acontecimentos nas páginas deste livro.
              E tudo começou assim, numa manhã ensolarada...
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Próxima semana, Capítulo I.
             

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