Amanda Gurgel - a professora brasileira que defendeu sua profissão
Marcia Kedouk
A professora Amanda Gurgel, 29 anos, fez um desabafo na Assembleia Legislativa sobre as condições da educação no Rio Grande do Norte. O vídeo com seu discurso já foi visto por mais de 1,8 milhão de pessoas e ela se tornou uma celebridade na defesa do ensino.
Nunca pensei que um discurso improvisado me tornaria conhecida, ainda que, na infância, dissessem que parecia adulta falando. Acho que perder meus pais em um acidente de carro, aos 4 anos, me fez amadurecer mais cedo. Eu e minhas duas irmãs mais velhas fomos criadas por tios na cidade de Poções (BA), mas nasci em Natal, onde moro. Só que ser órfã não me tornou uma coitadinha – de forma alguma.
Na juventude, fiquei indecisa entre o curso de jornalismo e o de letras. Uma professora de espanhol me inspirou a decidir pela segunda carreira, pelo jeito como ela abraçava a missão de ensinar. Sou formada em letras com especialização em educação de jovens e adultos e leciono em uma escola do Estado e em outra do município. Na adolescência, cheia de sonhos e ideo logias, não fazia ideia do que era o dia a dia de um professor. Somente na faculdade fiquei por dentro da precariedade da educação. Recém-formada, carregava o sonho de transformar esse cenário, mas sozinha não faria milagres. Cheguei a me questionar se fiz a escolha certa. Hoje não tenho dúvida que sim, pois não me vejo trabalhando com outra coisa. Nada mais compensador do que observar uma turma de alunos crescer.
Como sobrevivo com um salário de 930 reais? Faço como muita gente: trabalho dois turnos para esse dinheiro dobrar, embora ainda seja pouco. No dia 10 de maio fiz um desabafo em uma audiência pública na Assembleia Legislativa, em Natal. Não tinha ensaiado nada. Estava tão indignada com algumas falas anteriores que tomei coragem para rebatê-las. Meu pronunciamento foi mais um, entre tantos, transmitido pela TV Assembleia. Naquele dia, pouca gente viu, mas depois um colega colocou no YouTube e, em pouco tempo, o vídeo caiu em outras redes sociais. Desde então, meu telefone não para de tocar. Tem gente que diz que virei celebridade – fui até no Faustão –, mas o título não me cabe. Quando chego nas escolas, meus alunos e colegas vêm me cumprimentar com festa e perguntam por que não mandei um beijo para eles quando estava diante das câmeras. É engraçado.
Minha rotina é muito corrida. Além de dar aulas, participo do sindicato, falo em greves e manifestações. Também tenho viajado muito, a convite dos sindicatos de vários Estados. Apareci outras vezes na TV – e isso é um problema, pois nem sempre consigo me arrumar como gostaria e fico preocupada com tanta exposição. A sorte é que sou muito básica, só não dispenso creme para o cabelo, pó e batom. Com tantos compromissos, sobra pouco tempo para investir em minha vida pessoal. Mesmo assim, estou começando um relacionamento e acredito que tenha encontrado um homem com uma visão de mundo parecida com a minha, o que não é nada fácil. Nossa sociedade é machista e muitas mulheres vivem presas a relações de submissão. Não vale a pena perder a liberdade só para dizer que se tem um marido. Por isso, estamos indo devagar. Jamais abriria mão dos meus valores e de minhas crenças por um homem. Acredito que o sucesso do vídeo se deva ao fato de muitas pessoas estarem inconformadas – acabei me tornando a porta-voz. É uma pena que a sociedade, principalmente os pais dos estudantes, não tenha consciência política para entender que, se a situação das escolas melhorar, os filhos deles sairão ganhando. Meu maior ideal é viver em um mundo igualitário, no qual os educadores sejam tratados com mais respeito.
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